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Marielle: ser humano reduzido a um corpo disputado por abutres


Demorei para escrever sobre o caso da vereadora Marielle Franco, morta brutalmente em um atentado no Rio de Janeiro. E demorei porque não costumo escrever no calor da emoção e nem, tampouco, explorar casos de grande repercussão em busca de likes. Mas, as dramáticas repercussões do caso, que acabou virando uma dantesca arena política onde narrativas da extrema esquerda e extrema direita se divergem, me levam a comentar. Afinal, mal esfriou o corpo da vereadora para a mídia, os partidos e os movimentos virtuais fazerem de Marielle um objeto a ser disputado. Como hienas brigando pela mesma carniça (e neste caso, não me refiro à Marielle, mas o lastro deixado pela violência simbolizada por sua morte) esquerdistas e direitistas esqueceram o fundamental: antes de ser ativista política, mulher, negra e homossexual, Marielle era, sobretudo, um ser humano. E como tal, ela e sua família merecem respeito.

Marielle era uma figura da esquerda. Uma pessoa que defendia as bandeiras das minorias, dos pobres, dos direitos humanos. E, por serem bandeiras afins da esquerda acadêmica, é mais que natural que partidos e movimentos com a mesma cosmovisão faturassem, ainda que indiretamente com sua morte. Toda causa cresce quando ganha um mártir. E a mulher oriunda da favela, negra e homossexual é perfeita para virar bandeiras de partidos como o PSOL, da qual era eleita.

Para colocar mais fogo ainda no caldeirão político carioca, a morte de Marielle se deu num momento crucial para a segurança pública carioca, que é a intervenção federal na área de segurança. A intervenção é um objeto claro de disputa política entre esquerda e direita, já que a mesma é apoiada pela Direita e os partidos do chamado bloco do "Centrão" (PSDB, PSD, DEM, etc) e duramente criticada pela esquerda e seus partidos (PT,PSOL, PSTU). Marielle era uma das vozes mais atuantes contra a intervenção. Segundo ela, a ação militar não traria efeitos práticos, além de trazer mais prejuízos para as comunidades que, segundo ela, sofrem bastante com a violência policial. A intervenção, caso dê certo, será a vitória da direita e do "centrão". Marielle e seu mentor Marcelo Freixo sabiam que precisariam combatê-la. Não apenas pela violência policial e pelos direitos humanos. Mas, sim, porque a vitória da intervenção seria a vitória da direita e seu discurso de legitimação da violência como arma de combate ao crime.

Daí surge um cadáver no meio disso tudo. Uma vítima brutal, um mártir, era tudo o que a esquerda precisava para legitimar seu discurso de que a intervenção é um erro. Não estou aqui afirmando que a esquerda queria sua ativista morta. Mas, que sua morte é um trunfo político, isso ninguém pode negar. E seu simbolismo é tão forte que gerou reações estabanadas, para não dizer cruéis, dos carniceiros da extrema direita. Sem argumento para combater um trunfo tão forte, a turma do "bandido bom é bandido morto" partiu para a Fake News. Nada mais covarde do que atacar a imagem de quem já está morto e que, portanto, não teria como se defender. Movimentos financiados pelo "centão" como o MBL errarão a mão feio e mostraram a todos a sua canalhice ao tentarem difamar Marielle.

E os carniceiros da esquerda? Vê Lula, Dilma e companhia comparar o assassinado cruel e covarde da vereadora com o "golpe de 2016" é uma canalhice tão grande e absurda quanto ao do MBL. Quem tenta tirar proveito de um assassinato para ganhar votos, para mim, é o lixo da história. Neste ponto as extremas esquerda e direita podem dar as mãos. São abutres lutando pela carne exposta de um corpo que ainda sangra, clamando por Justiça!

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